quarta-feira, novembro 07, 2012

O meu novo "tacho"

O Centro Norte-Sul é uma estrutura que, desde 1989, tem sede em Lisboa e que tem como finalidade ligar o Conselho da Europa - em temáticas como a democracia, direitos do homem, diálogo intercultural, etc - a uma área a que se convencionou chamar Estados "do Sul", nomeadamente no continente africano.

Desde a sua criação, o Centro passou por várias vicissitudes e, se olharmos bem o tempo histórico, verificaremos que atravessou o período das grandes convulsões contemporâneas, desde a queda do muro de Berlim à emergência do terrorismo global, das grandes polémicas civilizacionais às chamadas "primaveras árabes". O mundo mudou muito, o Centro mudou com ele mas talvez não o suficiente para nele manter interessados Estados tão importantes como a Alemanha ou a França, os quais, com alguns outros, optaram por abandoná-lo, com as consequências orçamentais correspondentes. O Centro apresenta hoje um número de membros que é já inferior àquilo que formalmente é necessário para garantir a sua sustentação. E, porque o orçamento de que dispõe foi seriamente afetado, a sua capacidade para gerar iniciativas e projetos que cativem novos membros está hoje fortemente reduzida.

É perante este cenário de fundo, no mínimo extremamente complexo, que fui convidado a dirigir o Centro Norte-Sul, com o "estímulo" acrescido de não ir ganhar, nessa tarefa, um euro mais do que aquilo que já seria o meu salário normal de base, quando regressasse a Portugal, por imperativo de idade. Faço-o porque achei interessante assumir o desafio de tentar tirar o Centro - cujo acervo de atividades me parece muito interessante - da muito difícil situação em que se encontra. Logo veremos, a partir de 1 de fevereiro, se consigo fazê-lo ou não, com algumas ideias que tentarei pôr em prática.

Dia claro

Hoje, por uma vez, o sol nasceu a oeste. Nada garante que os dias que aí vêm para o mundo sejam brilhantes, mas, como europeu, fico bastante mais sossegado com a vitória de Obama.

Comboios

Era um homem muito simples, das Beiras. Começámos a conversar naqueles corredores estreitos do Sud-Express, em direção a Paris, naquele verão de 1970. Contou-me que ia para a Alemanha, onde trabalhava na construção civil. Para sempre, ficou-me uma frase que me disse, e que dava bem conta do profundo choque cultural entre o mundo de onde provinha e aquele em que habitava, num subúrbio de uma grande cidade: "Perto das barracas onde estamos 'anda' uma grande estrada e, à noite, quando nos chegamos à beira dela, aquilo até mete medo, com as luzes dos carros a passarem tão depressa". Em Portugal, nesse tempo, as autoestradas eram uma miragem.

À medida que nos aproximávamos da gare de Austerlitz, perguntei-lhe como iria para a gare du Nord, de onde partiria num outro comboio, para a Alemanha. Disse-me que havia motoristas portugueses que andariam por ali e que o transportariam entre as duas estações. Pelo que me contou, o preço que habitualmente lhe cobravam era uma exorbitância, um verdadeiro roubo. Era bem conhecida, na altura, a existência dessa máfia de portugueses desonestos, que rondavam Austerlitz e exploravam os desamparados compatriotas, que não sabiam uma palavra de francês e se abandonavam nas suas mãos.

Porque ele só tinha uma mala, perguntei-lhe se não queria ir de metropolitano, cujo bilhete era um preço ínfimo, comparado com o que os motoristas lusos lhe cobravam. Por acaso, eu ia seguir na mesma linha e, com todo o prazar, ajudá-lo-ia até à gare du Nord. O homem, que até então tinha tido comigo uma conversa distendida e cordial, olhou-me, claramente desconfiado com "tanta fartura", provavelmente convencido que eu lhe estava a tentar fazer algum "conto do vigário". À saída, de forma quase ostensiva, evitou-me e lá deve ter ido entregar-se nas mãos dos abutres lusitanos motorizados.

Ontem, na gare de l'Est, veio-me à memória o episódio passado com aquele português, ao constatar a atrapalhação de um cidadão, que vim a saber ser búlgaro, perdido no meio da multidão do fim de tarde, com um ar angustiado, sem falar uma palavra de francês, num ambiente de generalizada indiferença. Vendo-o nervoso, quase tremendo, com claro pânico de perder uma ligação, perguntei-lhe se necessitava de ajuda. Mostrou-me o bilhete. Orientei-o, levando-o até à porta da carruagem. Desfez-se em agradecimentos, talvez surpreendido por alguém se ter disponibilizado a auxiliá-lo, sem nada lhe pedir em troca.

Devo dizer que tive gosto em poder ter esse simples gesto, porque, às vezes, alguns trabalhadores estrangeiros que por aqui encontro, na simplicidade insegura de quem caiu num mundo que não domina, não deixam de me recordar os heróis anónimos das nossas vagas da emigração do século passado.

segunda-feira, novembro 05, 2012

América

Como acontece cada quatro anos, por estes dias, todos somos um pouco americanos. Todos (portugueses, chineses, russos e até israelitas) temos o "nosso" candidato numas eleições que cabe aos americanos decidir, sabendo, de certeza segura, que alguma coisa acabará por sobrar para nós daquele que vier a ser o resultado da sua escolha. Talvez não fique bem dizer isto, mas esta cíclica fatalidade é um sinal claro do que é, na realidade, a "independência" do resto do mundo. 

Ah! e uma coisa é clara: qualquer que venha a ser o presidente americano para os próximos quatro anos, ele vai, forçosamente, desiludir-nos. Porquê? Por uma razão bem simples: porque ele é eleito para defender os interesses americanos e não os nossos. 

Os dias do movimento (*)

Estes não são dias como os outros. Na carreira diplomática, as pessoas mudam de postos, de tempos a tempos. Uns transitam entre embaixadas ou consulados, outros passam de Lisboa (da "secretaria de Estado", no jargão da carreira) para lugares no estrangeiro ("para posto"), ou vice-versa. Às vezes, estas novas colocações acontecem caso-a-caso, espaçadas entre si no tempo. Outras vezes, as nomeações têm lugar para um conjunto mais ou menos largo de funcionários. Neste caso, ocorre aquilo a que se chama, na tradicional linguagem das Necessidades, "o movimento". São esses os dias que vivemos.

O movimento é um evento sazonal importante, uma reorientação dos destinos da casa pela tutela, com a atribuição de novas responsabilidades aos funcionários. O movimento mais importante, como é natural, é aquele que envolve os embaixadores e os lugares de chefia em Lisboa. Nunca se sabe, ao certo, quando esse movimento tem lugar, pelo que é invariavelmente precedido de uma imensidão de boatos sobre a sua efetiva concretização ("dizem que já está para assinatura em São Bento"), com palpites diários sobre datas ("cheira-me que ainda sai esta semana. Já tem o OK de Belém"), sempre de "fontes fidedignas" ("uma senhora do 'quarto andar' garantiu-me que já está para publicação") e bem informadas ("já seguiram os pedidos de "agrément", consta do gabinete") Umas vezes, as coisas vão-se sabendo aos poucos, fruto das fugas nas "consultas" ("Não digas a ninguém! O homem pediu-me silêncio, mas foi sondado e aceitou, com a garantia da "promoção", vá lá!"), noutras permanecem "no segredo dos deuses" até bastante tarde.

Sobre a substância do movimento, a "cultura" do claustro e dos corredores cria, durante semanas consecutivas, "bocas", mais ou menos fundamentadas ("nem te passa pela cabeça quem vai para Bamako!" ou "já está tudo assente: o homem vai mesmo para Hanói. Até já tratou da escola para o filho..."). A coreografia também é vista à lupa ("o tipo já se passeia como se o lugar fosse dele" ou "dizem que o homem anda, há dias, a rondar o 'terceiro andar'" ou ainda "viram-nos a almoçar juntos nas 'Espanholas'; não é por acaso!").

Com a aproximação do seu anúncio, as informações sobre o movimento vão-se tornando mais fidedignas, sendo progressivamente preenchido o quadro virtual de vagas ("afinal, confirma-se que 'fulano' sempre avança para Kampala. O 'beltrano' bem tentou, mas lixou-se e não conseguiu o posto"). Há sempre uns "connaisseurs" frustrados, que depois procuram justificar os seus erros de avaliação ("estava para ser como eu te tinha dito na semana passada, mas houve acertos de última hora, garantiram-me! É sempre assim!"). Há, ainda, as desilusões ("'sicrano' está fulo! Tinha por certo ir para Dushambe e, afinal, fica na secretaria de Estado. Parece que está à espera de Ulan Bator, que só 'abre' em maio, com a passagem 'à disponibilidade' do outro").

E, por fim, há as surpresas. As surpresas são o verdadeiro "sal" dos movimentos, as nomeações de quem se julgava "não colocável" ou de quem se não esperava que viesse a assumir certas funções. Tanto podem emergir de postos atribuídos ("então não queres ver que aquele tipo, depois de tudo o que se passou, ainda conseguiu ser colocado em Cartum? Francamente!...") ou (caramba! Viste o "postaço" que o tipo apanhou, vindo de onde vinha?) como dos lugares "na secretaria de Estado" que foram objeto de preenchimento ("e o homem lá vem para o lugar que queria. Vamos ter que o aturar em Lisboa. Com o feitio dele, vai ser bonito!").

Frases mais ou menos parecidas com estas devem ouvir-se, por estas horas, no claustro e corredores das Necessidades. Foi sempre assim! Os dias do movimento são sempre dias movimentados.


(*) Esta é, no essencial, a reprodução de um post de 3.1.12. Voltou a ser atual, razão pela qual o republico

sábado, novembro 03, 2012


Justiça e Paz

No início da minha intervenção, deixei claro que vinha "de outra freguesia", mas isso não diminuiu o grande gosto que tive em participar em mais uma iniciativa da Comissão Nacional Justiça e Paz, que hoje teve lugar na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa. O convite foi-me formulado pelo professor Alfredo Bruto da Costa, uma figura por quem tenho grande admiração, pela sua persistente luta em favor daqueles que a sorte esqueceu.

O tema do encontro era "Portugal - o país que queremos ser", mas a mim coube-me, num "mano-a-mano" com o meu amigo Guilherme Oliveira Martins, trabalhar de forma crítica e prospetiva o documento "Para uma reforma do sistema financeiro e monetário internacional na perspetiva de uma autoridade pública de competência universal". Trata-se de um interessante texto que, apoiado em algumas Encíclicas, interpela os cidadãos e os Estados, lançando desafios ao mundo multilateral. O debate que se seguiu foi muito enriquecedor e, como não podia deixar de ser, cruzou a doutrina social da Igreja com a política europeia e algumas temáticas do quotidiano nacional.

Na minha intervenção, procurei sublinhar os aspetos mais relevantes das propostas contidas no texto e julgar da sua compatibilidade realista com os modelos multilaterais relevantes, desde a ONU à OMC, das questões ambientais globais à reforma do sistema de Bretton Woods.

E, de passagem, porque o documento, que tem origem no Vaticano, é impiedoso para as derivas liberais, não deixei de notar a estranha circunstância de ser da Universidade Católica Portuguesa que emana a mais radical produção neoliberal que por aí anda, ao que parece, como fiz questão de dizer, bem menos preocupada com a pauperização da sociedade do que com a promoção da "popperização" das almas.

Abandono

Nesta madrugada, leio no "Público", na net: "Embaixador Francisco Seixas da Costa abandona funções em Paris". Só aparece o título, mas a notícia deve sair logo na edição impressa. Mas para quem, nas horas que faltam, atentar apenas nessa linha, pode ficar a dúvida: foi ele quem abandonou o posto? Ou "sanearam-no"? Não seria a primeira vez...

Nada disso. Dentro de menos de três meses chego, com toda a naturalidade, ao limite da idade em que, por lei, posso permanecer em funções no estrangeiro. Tenho esta data na cabeça desde que, em 14 de agosto de 1975, entrei para o MNE. O meu regresso a Lisboa é, assim, em tudo idêntico ao que abrangeu uma imensidão de colegas, em todas as gerações. 

Se acaso o "Público" me tivesse perguntado, ter-lhe-ia revelado, em exclusivo, que irei chegar a Lisboa 48 horas antes da data do limite de idade, por razões - essas sim! - extremamente ponderosas: tenho nessa noite uma reunião do "praesidium" da "mesa dois" do bar "Procópio", que lançará as bases para o nosso jantar anual, que, desta vez, terá lugar em fevereiro. Há minutos, por lá, entre cervejas e chás, foi escolhido um nome para o repasto 2013, desta vez com inevitável odor a "troika": "Jantar da Refundação". Que tal?

sexta-feira, novembro 02, 2012

Partidas & chegadas

Ainda um dia alguém me há-de explicar por que diabo, perante horas a aguardar o embarque num avião, como aquele que neste momento me faz perder a tarde em Orly, nos é dada a justificação de que "o atraso é devido à chegada tardia do avião". Estão a gozar conosco ou quê? Que nos interessa saber se foi a chegada tardia (e, se foi assim, porque se atrasou?) ou a birra de alguma tripulação ou um parafuso mal apertado?

Essa informação é tão importante quanto aquela pateta indicação (sempre presente em cada voo) sobre a temperatura exterior ou a altura a que o avião segue? O que é que isso interessa? Evita que saiamos para apanhar ar?

Digam-nos apenas, com certeza certa, a que horas sairemos, para podermos planear a vida e, até lá, e também se possível durante o voo, não nos poluam os ouvidos, sim? Pagámos para viajar no sossego que for possível.

quinta-feira, novembro 01, 2012

Condolências diplomáticas

Sempre que uma personalidade política de relevo de um país morre, é de regra que as embaixadas que esse Estado tem espalhadas pelo mundo abram, durante alguns dias, um livro de condolências. Esse livro recolhe notas de simpatia de quem quiser associar-se aos pêsames. As embaixadas de países amigos costumam marcar a sua presença, através do embaixador ou de um outro funcionário por este indicado.

Por regra, os embaixadores reservam-se para as condolências por morte de figuras mais relevantes - chefes de Estado ou de governo -, encarregando da tarefa um seu colaborador quando a figura desaparecida tem uma importância institucional menor. Diga-se que já tenho visto a abertura de livros de condolências pelo falecimento de personalidades que estão muito longe de ser conhecidas no exterior e, muito menos, são relevantes. Mas imagino que as embaixadas não possam eximir-se às instruções que recebem das capitais.

Um dia, algures, um embaixador estrangeiro pediu para me ver, com alguma urgência. Recebi-o pouco depois. Entrou no meu gabinete de semblante grave e com ar muito preocupado. O que tinha acontecido? Na véspera, tinha-se deslocado à embaixada de um país de expressão portuguesa, para preencher o livro de condolências pela morte de uma importante figura de Estado. Porém, por um "lamentável lapso", em todo o longo texto que escrevera no livro, com quase uma página, onde relevara as imensas qualidades e a sabedoria do estadista que desaparecia, colocara erradamente, e por mais de uma vez, o nome de um outro Estado lusófono.

Esse colega, com "pouca África" no currículo e de uma área do mundo dela algo distante, estava seriamente mortificado com as consequências potenciais que esse seu lapso poderia vir a ter nas relações entre o seu país e o Estado lusófono em luto, que seguramente se iria sentir ofendido com o seu grosseiro erro. Vinha perguntar-me o que haveria de fazer, "porque vocês conhecem-nos melhor a eles".  

Pondo implicitamente de parte a "expertise" pós-colonial que me era atribuída, pensei alto, com base no bom senso. Se acaso fosse pedir desculpa ao embaixador que tinha aberto o livro de condolências, seria muito difícil dar-lhe uma razão plausível para trocar o nome do seu país. Seria como que uma presunção da irrelevância do Estado que ele representava ou um atestado à sua própria ignorância (não sei se tive coragem de lhe dizer isto, confesso). Assim, não me parecia que ganhasse grande coisa com um ato de contrição. Mas também não poderia excluir que, se acaso o erro fosse detetado, alguns sobrolhos nacionalistas se cerrariam. Era, de facto, uma situação com contornos algo delicados. 

E, sem ter nenhuma certeza, deixe-lhe um conselho, ou melhor, disse-lhe o que faria se acaso estivesse no seu lugar (situação que, sem falsa modéstia, me parecia implausível). Porque sempre presumira que ninguém se devia dar ao trabalho de ler os livros de condolências abertos pelas embaixadas no estrangeiro, devendo haver apenas um levantamento das assinaturas, eu era de opinião de que talvez valesse a pena, pura e simplesmente, esquecer o assunto. Não o vi muito sossegado, mas agradeceu, concordando, a minha sugestão e lá saiu, ainda ajoujado de culpa. 

Tempos mais tarde, numa conversa com o embaixador lusófono, testei-o quanto ao colega "gaffeur", para tentar perceber se acaso existiria, da sua parte, algum agravo. Inventei, assim, que tinha ouvido, da parte deste, palavras muito simpáticas a seu respeito. A resposta surpreendeu-me: "Ah! mas é um grande amigo! Ainda há dias, organizou um jantar em minha honra na sua residência. Temos excelentes relações!". 

Ora ainda bem, pensei para comigo. E, inapropriadamente divertido no meu íntimo, tenho-me sempre lembrado desta história quando, nas embaixadas, assino os livros de condolências, coisa que faço sempre com a maior atenção à geografia.

O outro défice


Das notícias de hoje:
  • a justiça deixou prescrever o caso Bragaparques.
  • Valentim Loureiro recusa-se abandonar a Câmara municipal de Gondomar, apesar da decisão da justiça. (E, em Oeiras, tudo continua como dantes, à espera das prescrições).
  • estivadores, que prosseguem uma greve que está a condicionar fortemente as exportações, assumem tristes atitudes públicas de desrespeito em frente ao parlamento.
  • os maquinistas da CP voltam, uma vez mais, a tomar o país como refém.
  • os sindicatos da (pública) Caixa Geral de Depósitos aproveitam para gozar a ponte.  
Em tempo: e que os puristas não venham com a tese da independência do poder judicial e os obreiristas com a "justa luta" dos que têm ótimos empregos...

quarta-feira, outubro 31, 2012

Eça, agora!


Como diria enfaticamente José Hermano Saraiva, "foi aqui", no nº 5 da rue Crevaux, que liga a avenue Foch à avenue Bugeaud, que José Maria Eça de Queiroz, recém nomeado Cônsul de Portugal em Paris, alugou a sua primeira habitação, das três que viria a ocupar durante a sua estada na capital francesa, onde morreu em 1900. 

Eça viveu na rue Crevaux entre 1889 e 1891 e, por alguma razão, esta sua morada não estava assinalada com uma placa. Decidi tomar a iniciativa de colmatar esta lacuna e, passados meses de autorizações e procedimentos administrativos, vai ser agora possível descerrar essa memória.

Assim, no domingo, dia 25 de novembro, às 12.00 horas, celebrando nesse dia a data do nascimento de Eça de Queiroz, será feito o descerramento formal da placa. De seguida, quem estiver presente ao ato é convidado a beber uma taça de champanhe na Embaixada de Portugal, que fica relativamente perto. Apenas se pede que as pessoas que se queiram associar se inscrevam pelo mail portugal.paris@gmail.com.

Vigília


Não resisto a transcrever, do seu blogue Tim Tim no Tibet, o poema do meu colega embaixador Luís Filipe Castro Mendes, intitulado "Vigília":

Não te deixes adormecer: 
é o que dizem a quem luta por estar vivo,
é o que nos dizemos quando
o frio já entrou muito fundo dentro de nós
e toda a vida se deixou cobrir de nevoeiro.

Não, eu não me deixarei dormir.
Descansa, tu que cada madrugada 
encontras as minhas mãos 
a afastar o frio e o nevoeiro.
Eu não me deixarei dormir.
Nós não nos deixaremos dormir.
O nosso amor é uma vigília sem quebras
e nunca nenhum povo se deixou hibernar.

Em tempo: e, para quem estiver em Lisboa, porque não dar uma saltada aqui.?

Emigração

O comportamento do Estado Novo face à emigração é o tema de um livro de Victor Pereira, intitulado "La dictature de Salazar face à l'émigration - L'État portugais et ses migrants en France (1957-1974)". O autor é doutorado em História pelo Instituto de Estudos Políticos, em Paris.

Convidei Victor Pereira para apresentar o seu trabalho na Embaixada, no dia 26 de novembro. Dada a escassez de lugares, quem estiver interessado em estar presente nesta sessão de lançamento e no debate que terá lugar na ocasião deverá inscrever-se através do mail portugal.paris@gmail.com.

terça-feira, outubro 30, 2012

Ben Barka

Em 29 de outubro de 1965, ao sair de um almoço da brasserie Lipp, no boulevard Saint-Germain, o oposicionista marroquino Mehdi Ben Barka, foi raptado. Seria mais tarde barbaramente torturado e morto.

Ben Barka foi um democrata que desde muito cedo lutou pela liberdade no seu país e é uma figura por quem nutro grande admiração. A saga do seu rapto e a teia de cumplicidades e interesses que estiveram por detrás do seu assassinato constituem, aliás, um terreno de investigação histórico-político do maior interesse.

Tinha prometido a mim mesmo que, durante estes quatro anos de Paris, tentaria saudar a sua memória, almoçando, na data do seu rapto, no mesmo restaurante. Acabei por conseguir fazê-lo uma única vez, levando comigo dois amigos que partilhavam a mesma recordação.

Ontem, uma vez mais, compromissos profissionais, a que não pude nem quis escapar, impediram-me de celebrar na Lipp (os "connaisseurs" dizem "no Lipp") a memória de Ben Barka.

Resta-me assim deixar uma nota neste blogue.

segunda-feira, outubro 29, 2012

Decanato

O novo presidente da Assembleia Nacional francesa, Claude Bartolone, tomou a simpática iniciativa de organizar, na noite de ontem, um jantar de debate, reunindo um grupo pouco comum de embaixadores: os representantes diplomáticos dos países da zona euro. Ao sentarmo-nos à mesa, reparei ter tido direito ao lugar de honra, entre os convidados. Olhei à volta e dei-me conta que já era o "decano" dos diplomatas presentes. Como o tempo passa...

A rotação temporal dos embaixadores é uma regra comum. Em geral, em cada quatro ou cinco anos, os embaixadores mudam de funções, indo assumir a chefia de outras representações diplomáticas ou consulares no exterior, ou regressando temporariamente às suas capitais. Esta regra aplica-se também aos restantes diplomatas, sendo que há alguns países que optam por seguir modelos diferenciados.

Com o tempo, percebi que essa mudança regular dos diplomatas tem todo o sentido. Se bem que, à primeira vista, se possa argumentar que se ganharia em ter as pessoas mais tempo nos postos, aproveitando a sua experiência e melhor explorando as redes de contactos entretanto estabelecidos, a verdade é que se constata que o "refrescamento" dos lugares favorece a assunção de novos olhares sobre a realidade local, evitando a queda em rotinas e vícios de perspetiva. Não raramente, o diplomata que fica muitos anos num posto deixa de "ver" o que entretanto mudou e acultura-se a uma certa leitura dos factos e das pessoas, que pode acabar por afetar a eficácia do seu trabalho. Além disso, a rotação permite um enriquecimento dos diplomatas, através de experiências diferentes, em contacto com outras sociedades e situações, o que constitui um importante fator de formação profissional. Não será por acaso que a generalidade das carreiras diplomáticas segue um procedimento basicamente idêntico.

Mas há exceções. Em 2001, nas Nações Unidas, vi-me um dia confrontado com um caso singular. Tinha chegado há escassas semanas e fiquei sentado, num almoço, ao lado do embaixador do Kuwait. Perguntei-lhe há quanto tempo estava em posto, em Nova Iorque. A resposta deixou-me siderado: "21 anos". Comentei que, assim sendo, deveria ser o "decano" dos embaixadores. Respondeu-me que não, que o colega do Iémen estava por lá há ... 28 anos!

Mal eu sabia então que, no meu caso, iria ficar por Nova Iorque apenas cerca de ano e meio...

A nova emigração

O novo surto migratório originário de Portugal é um fenómeno de que, só muito recentemente, começa a traçar-se um perfil mais rigoroso. Os dados estatísticos existentes assentam apenas em estimativas e têm um elevado grau de incerteza, pela inexistência de referências absolutamente seguras. Mas fica evidente que estamos já perante um movimento quantitativamente significativo, com uma dispersão geográfica bastante maior do que a das vagas migratórias de um passado mais recente.

Globalmente, e como não será de surpreender, os novos migrantes que procuram a Europa têm uma qualificação académica média bastante superior à de quantos, nos anos 60 e 70 do século passado, saíram pelos caminhos de França, da Alemanha e do Luxemburgo, ou mesmo dos que, de forma sazonal ou mais permanente, procuraram depois a Suíça e o Reino Unido*. Os dados e as informações disponíveis mostram-nos que muitas dessas pessoas saem acompanhadas pelas famílias, o que altera significativamente o modelo de outros tempos e, naturalmente, induz outros impactos nas exigências do seu quotidiano.

Há um ponto que me parece importante registar, porque dele resultam consequências comportamentais muito particulares: a maioria desses novos emigrantes portugueses obtém ocupações profissionais que se situam, quase sempre, abaixo daquelas que, legitimamente, o seu nível académico poderia justificar, o que constitui um natural elemento de frustração pessoal, com efeitos no seu estado de espírito. A crise e o aumento do desemprego em muitos dos seus países de destino faz com que, uma vez mais, apenas lhes sejam oferecidas tarefas profissionais que os nacionais desses países procuram menos e, frequentemente, com um elevado grau de precariedade no vínculo laboral. Daqui resulta, muitas vezes, uma tendência para uma fixação breve nos postos de trabalho obtidos, na busca incessante de outras oportunidades entretanto vislumbradas. Alguns empresários portugueses em França, que para aqui vieram em gerações anteriores e perseveraram muitos anos em tarefas modestas antes de descobrirem os caminhos do seu sucesso pessoal, referem essa instabilidade como um fator que, por vezes, os desmotiva ao acolhimento dos novos migrantes portugueses. Mas os casos de solidariedade neste domínio são cada vez mais frequentes e louváveis.

Como por aqui tenho dito, ser obrigado a emigrar por razões económicas é a triste constatação de que o país não é capaz de criar condições para a plena realização, no seu seio, dos cidadãos nacionais. As pessoas que saem, não apenas são forçadas a esse sacrifício como, muitas vezes, acabam por ser elas a contribuir, com aquilo que ganham no exterior, para o aumento da riqueza nacional. Só podemos desejar que, deste novo ciclo da viagem dos portugueses pelo mundo, acabe por resultar um futuro mais feliz para a sociedade portuguesa, com o retorno de muitos dos que agora são obrigados a partir, depois de novas experiências e de qualificações adquiridas, que possam ajudar a reforçar a modernidade e o desenvolvimento do país.
* Em tempo: e Espanha e Andorra, claro.

domingo, outubro 28, 2012

Subtileza

No início de um espetáculo, na noite de domingo, ouvi esta "pérola", de uma elegância mais do que subtil, antes do início da "performance": "Chama-se a atenção das pessoas presentes para a necessidade de ligarem o seu telemóvel quando saírem do teatro".

Hora

Hoje, temos a mais uma hora, coisa que, por ora, ainda está isenta de impostos. Aproveitem-na!

sábado, outubro 27, 2012

Os tomates e a Europa

Só hoje me chegou uma crónica de Miguel Esteves Cardoso, no "Público", há três dias, sob o título "Não mexam nos tomates", que passo a transcrever, sem quaisquer comentários e sem sombra de modéstia:

"Estava ontem na primeira página do "Público": só a Califórnia é mais produtiva do que Portugal no tomate. Lá dentro, na peça de Jorge Talixa, são de festejar os 1,2 milhões de toneladas de tomates produzidas este ano. Este ano, por acaso, os tomates foram bem mais suculentos do que nos dois anos anteriores. Comemos muitos mas, sobretudo, não esbanjámos nenhuns, como naquela absurda festa espanhola do tomate, que todos os anos deixa larga nódia na nossa imprensa, como se fosse novidade. Quem nunca tiver visto uma foto de um jovem espanhol encharcado em sumo de tomate tem uma sorte invejável. Conseguimos até exportar 95% desses tomates. Isso rende-nos 250 milhões de euros: é um número redondo demais para ser inteiramente crível mas, pronto, é muito dinheiro.

O medo agora é que a UE, através da Política Agrícola Comum (PAC), venha a proibir tal abundância. Nesta altura em que de novo se fala de Portugal ser o melhor aluno da zona euro, lembro uma notícia de maio de 1996, altura em que Portugal produzia só 900 mil toneladas.

Também há 16 anos a PAC quis cortar-nos os tomates. O secretário de Estado para os assuntos europeus de então, Francisco Seixas da Costa, avisou logo que se tinha acabado essa história de sermos os "bons alunos" da Europa, com tudo o que isso "implicava de subordinação".

Mantenha-se a mesma insubordinação e pode ser que, daqui a 16 anos, cheguemos a 1,5 milhões de toneladas. E passemos à frente da Califórnia".

Fora da História

Seria melhor um governo constituído por alguns nomes que foram aventados nos últimos dias mas que, afinal, acabaram por não integrar as esco...