quinta-feira, março 04, 2010

Greve

Uma greve é um gesto coletivo de protesto que resulta do usufruto dos direitos que a democracia a todos concede. Quem a faz fá-lo por razões que considera importantes e, só por isso, essa sua atitude deve ser respeitada e ponderada.

Desde que cheguei a Paris, há mais de um ano, esta é a terceira vez em que a Embaixada quase se esvazia, pelo exercício do direito à greve do pessoal administrativo.

Esta nota não se prende com as razões invocadas, liga-se ao efeito sobre o quotidiano do serviço.

Para quem não tem razões para fazer greve, a Embaixada, nestes dias, muda completamente de perfil, nos seus corredores instala-se um silêncio ou um mero rumor, como que se os passos dos que ficam fossem dados sobre veludo.

10 comentários:

Helena Sacadura Cabral disse...

Senhor Embaixador, não me leve a mal, mas este seu retrato de uma greve é o mais impressivo que conheço. Parece que estou a "ver" o vazio dos corredores!

Anónimo disse...

Há uns largos anos atrás, meados de 80, registou-se uma greve idêntica, afectando também os serviços das Embaixadas e Consulados. Recordo-me de por razões de trabalho ter de ligar para o Consulado-Geral em Madrid e, para meu espanto, ter atendido o próprio C-G. Perguntei-lhe: “então não está aí mais ninguém para o apoiar?”
Resposta daquele meu colega: “ninguém, pá, estou aqui sozinho, numa confusão que nem imagina. Tenho de fazer de porteiro, telefonista, escriturário, secretária, arquivista e de mim mesmo! É muita coisa junta! E já não tenho idade para isto! E a fazer atendimento ao público! Logo de me havia de cair uma coisa destas em cima! E ainda nem almocei!” Sosseguei-o dizendo que pelo ministério as coisas também não estavam muito melhores, tentando consola-lo: “é ao preço da Democracia! Não se preocupe! Quanto ao almoço, olhe, é da maneira que perde uns quilos!”
Ripostou logo: “Nah! Ficar sem comer é que me dana, pode crer! É o que me custa mais! Bolas!”
Adido de Embaixada

Anónimo disse...

Às vezes, há cada coincidência ! O chefe do sindicato que organiza a greve nas Embaixadas e nos Consulados chama-se Jorge Veludo. Precisamente a última palavra utilizada pelo Senhor Embaixador nesta postada. Coinciência, claro...

ATF

Anónimo disse...

notável a perspicácia de ATF em reparar na polissemia com a palavra "veludo". e notável a coincidência, pois é disso, obviamente, que se trata...

Jorge da Paz Rodrigues disse...

Meu caro Sr. Embaixador:

Com todo o respeito pelo seu trabalho, que é muito e que acompanho desde que desempenhou até há bem pouco tempo no Brasil, não posso deixar de lhe transmitir um comentário de um velho funcionário consular português:

"São estes que justificam os 14,1% de adesão - os inúteis - aqueles que, quer estejam em serviço, quer não, em nada mudam o verdadeiro valor dos que efectivamente trabalham. O governo ou mente em relação aos números, ou a realidade é que na administração pública cerca de 80 % dos funcionários estão no grupo dos inúteis, porque se mais de metade dos Serviços públicos comprometem o decurso normal de funcionamento ou têm mesmo que fechar portas com apenas 14,1% de trabalhadores a menos, é necessário repensar a posição e utilidade dos "passos (mudos) dos que ficam" e que, a serem reais os números do governo, colocam cerca de 80% dos funcionários públicos numa situação delicada! "

Dá que pensar Sr. Embaixador.

Os melhores cumprimentos,
Jorge da Paz Rodrigues

Anónimo disse...

Bem partilho do Seu conceito de Greve, essencialmente como grito reivindicativo, ultimamente parece o único com efeitos operacionais efectivos de sensibilização dos governos para as sempre quase mudanças desejadas no percurso estrutural e salarial das carreiras profissionais.

Também achei a imagem reveladora...
Gostava era de saber como activou a sua inspiração,de que forma para Si,Sr. embaixador, uma vez que partilho a opinião da Dra. Helena.

Fui entretanto por os óculos e o que inicialmente me pareciam tijolos (metáforas de alicerces mão de obra)e caixinhas bordeaux simulando embrulhos de jóias, daquelas grandes essências que se guardam em reservatórios pequenos...Parece-me uma decoração
de um recanto para arrecadação...

Acho as greves cada vez mais braços de ferro onde a negociação pressupõe "alguém" que pede de forma inflacionada face ao exequível e se persegue o

"Paloma buscando cielos más estrellados
Donde entendernos sin destrozarnos Donde sentarnos y conversar"
Isabel Seixas

margarida disse...

Compreendo que o tema seja, digamos, delicado.
Sobretudo para quem tem responsabilidades públicas.
Eu não tenho.
E sou geniosa, por isso afirmo desassombradamente que estas greves são injustificadas face às novas realidades com que o nosso país (e o mundo) se debatem.
E não simpatizo com o governo. Nem sequer com a oposição (Bem! estou aqui estou a descobrir-me anarquista!). Isto tudo maça de tão repetido; de tão pobre.
É preciso trabalhar!
É preciso compreendermos que temos muito face a imensos que pouco ou nada têm!
É necessário negociar muito e não amuar (e fala quem sabe do tema) e fazer birra!
As greves só prejudicam o povo. Esse 'povo' com quem tanto os sindicalistas enchem a boca para defender as mordomias dos seus associados.
Isto agora levava-nos tão longe...
Deixem-se de mimalhices e metam as mãos à obra que o país não se levanta sozinho!
E dêem graças a Deus (ou a Marx, ou a quem quiserem) por terem emprego. Segurança. Perspectivas de algum futuro.
Porque a esmagadora maioria tem isso tudo e "protesta" de barriga cheia.
Talvez seja porque tive antepassados que 'trabalhavam de sol a sol por uma côdea', como contavam em casa.
Ee fizeram-se à vida; e singraram. E não foi com 'greves' e quejandos...
Ou porque 'a minha política é o trabalho' foi algo que se me inculcou.
Defender princípios, sim; debatermo-nos por direitos razoáveis, concerteza, preguiçar e pedir impossibilidades enquanto se incomoda o próximo, nem pensar!
Sei de quem faça 'greve' para 'não se cansar' por um dia.
Aliás, todos sabemos de muita coisa pouco edificante sobre os 'trabalhadores' e os dependentes dos subsídios e por aí fora.
Continua a velha história de que 'sobra sempre para os mesmos'.
Nem mais.

Julia Macias-Valet disse...

E qual é o motivo deste "Mouvement Social" ?

Helena Oneto disse...

Preferi, de longe, a foto que ilustrou o post sobre a greve (do pessoal administrativo) que prececeu a de ontem (aliás os comentários feitos nessa ocasião ao colo e à elegância da suposta funcionaria em greve são uma delicia...!:).
Nesta terceira greve, as curvas deram lugar a linhas paralelas e a angulos rectos! Nestes cubos, onde o "bordeaux" das cadeiras não chega para confortar os animos, o ambiente é mais tenso diria mesmo no limite do desconfortável...

José Cavalheiro disse...

Boa Tarde Sr. Embaixador.

Hoje deu-me para isto, ler os seus posts, e encontrar em alguns dos comentários que lhe fazem saudosistas do Estado Novo, possivelmente pessoas que não tiveram o ingrato "prazer" de suportar as prepotências de um Salazarismos que nos amordaçava a boca, tal como o "nosso Primeiro", José Sócrates, tentaria fazer se lhe dessem essa hipótese de se tornar no "paizinho da nação" como o fez Salazar ao derrubar a República democrática.

Cada vez tenho mais a impressão de que temos o Povo que merecemos assim como os Políticos que deixamos dirigir o nosso destino, ingrata sina minha que não voto no centro esquerda/direita, o chamado centrão.


Junto para os mais ignorantes a definição do termo GREVE:

Greve é a cessação colectiva e voluntária do trabalho realizada por trabalhadores com o propósito de obter benefícios, como aumento de salário, melhoria de condições de trabalho ou direitos trabalhistas, ou para evitar a perda de benefícios. Por extensão, pode referir-se à cessação colectiva e voluntária de quaisquer actividades, remuneradas ou não, para protestar contra algo.
A palavra origina-se do francês grève, com o mesmo sentido, proveniente da Place de Grève, em Paris, na margem do Sena, outrora lugar de embarque e desembarque de navios e depois, local das reuniões de desempregados e operários insatisfeitos com as condições de trabalho. O termo grève significa, originalmente, "terreno plano composto de cascalho ou areia à margem do mar ou do rio", onde se acumulavam inúmeros gravetos. Daí o nome da praça e o surgimento etimológico do vocábulo, usado pela primeira vez no final do século XVIII.

Originalmente, as greves não eram regulamentadas, eram resolvidas quando vencia a parte mais forte. O trabalho ficava paralisado até que ocorresse uma das seguintes situações: ou os operários retornavam ao trabalho nas mesmas ou em piores condições, por temor ao desemprego, ou o empresário atendia total ou parcialmente as reivindicações para que pudessem evitar maiores prejuízos devidos à ociosidade.


Ainda para os mais distraídos, não esquecer que por cada trabalhador que faz greve além de perder um dia de ordenado ajuda o Estado a minimizar o "DÉFICE" ..... ingrata sina do trabalhador grevista.

Pessoalmente farei GREVE sempre que sentir, tal como acontece nos tempos correntes, os meus direitos, os direitos conquistados com o 25 de Abril de 1974 em causa.

Fora da História

Seria melhor um governo constituído por alguns nomes que foram aventados nos últimos dias mas que, afinal, acabaram por não integrar as esco...